in A BOLA
Afinal foi a Grécia que concretizou o «sonho»
Portugal perdeu esta noite a oportunidade de sagrar-se campeão europeu de futebol, ao ser derrotado pela Grécia, por 1-0, no Estádio da Luz, na final do Euro2004. A euforia que esperávamos viver esta noite acabou por se transformar numa imensa onda de desilusão...
É difícil escrever a crónica de um jogo assim. O relato da desilusão que invadiu um país que acreditou para além do limite do possível na vitória da «selecção de todos nós». Custa encontrar palavras que traduzam fielmente a sensação de vazio que de repente ocupou o lugar da euforia com que todos nos habituámos a viver nos últimos dias. Sobretudo por a derrota de hoje deixar este estranho sabor amargo provocado pela convicção de que os «heróis» portugueses que estiveram em campo fizeram todos os possíveis para evitar o desaire. Mas mesmo assim não foi possível...
Muito por culpa, refira-se, de um Grécia que apresentou hoje um espécie de versão «best-of» dos argumentos que a fizeram caminhar até esta final. Uma defesa insuperável, um meio-campo combativo até ao limite das suas forças e... o aproveitar ao máximo dos lances de bola parada para concretizar as escassas ocasiões de visar a baliza adversária.
Já fora construída desta forma a eliminação da República Checa nas meias-finais. E hoje bem se pode dizer que o filme se repetiu... Porque de nada valeu a Portugal assumir as despesas do jogo logo desde o apito inicial de Markus Merk.
A velocidade implementada pelos portugueses no desenvolvimento dos lances ofensivos nos primeiros minutos da partida não se traduziu em ocasiões de real perigo para a baliza de Nikopolidis, em grande parte porque a Grécia cedo deixou perceber que Portugal podia jogar em todo o terreno menos nos últimos (e cruciais) 30 metros. Aí, outros «valores» se levantavam. Os de uma defesa de betão, superiormente comandada por Dellas, bastante bem secundado por Kapsis, Seitaridis, Fyssas e Bassinas, incumbidos de criar uma muralha intransponível para o génio dos nossos jogadores.
Miguel e Maniche ainda conseguiram encontrar espaço para tentar o remate à entrada da área, mas o primeiro foi desviado por Nikopolidis para canto e o segundo passou escassos centímetros ao lado do poste. E a lesta resposta grega acabou por refrear o ímpeto da equipa portuguesa, que após sofrer alguns contra-golpes, tomou noção da mensagem deixada pelos gregos, ao jeito de «também estamos aqui para discutir a vitória».
A tónica do jogo manteve-se praticamente até ao golo da Grécia. Se nos primeiros 45 minutos o ascendente fora sempre português, o cenário manteve-se no reinício da partida. Só que continuava a ser complicado encontrar antídoto para ultrapassar um adversário que, mesmo quando era apanhado em (raros) lances de contra-ataque, tinha sempre uma linha de cinco, seis homens atrás da linha da bola, inviabilizando qualquer possibilidade de a equipa portuguesa «romper» a caminho da baliza.
Até que aos 56 minutos, na sequência de um pontapé de canto, a Grécia acabou por colocar-se em vantagem, com Charisteas a aproveitar da melhor forma um canto cobrado por Basinas para elevar-se melhor que Costinha e cabecear para o fundo da baliza de Ricardo. Gelaram os adeptos portugueses nas bancadas do Estádio da Luz. Gelou todo o país, não acreditando ser possível estar a assistir à euforia que os adeptos gregos viviam nas bancadas.
Mas ainda faltava cerca de meia hora para o final do jogo e era preciso acreditar. E os jogadores portugueses foram os primeiros a fazê-lo. Scolari lançou Rui Costa para o lugar de Costinha e este começou de imediato a «mexer» no jogo, surgindo ora à direita ora à esquerda, procurando conduzir as movimentações ofensivas, combinar com Figo ou Deco, insistindo no remate de meia distância.
Minutos depois, foi a vez de Nuno Gomes render o apagado Pauleta. E o assédio às redes de Nikopolidis intensificava-se. Mas os cruzamentos que se sucediam eram invariavelmente afastados pela defesa. Os remates paravam na muralha defensiva grega. E quando finalmente parecia ser possível gritar golo!, o destino teimava em negar-nos tal direito...Como no lance de Ronaldo, aos 74 minutos, quando o jovem jogador português aproveitou uma das raras desatenções helénicas para surgir isolado perante Nikopolidis. Mas o remate acabou por sair alto de mais, levando a bola a sobrevoar a barra da baliza grega.
Já na fase de desespero, foi a vez de Figo tentar a sua sorte, após encontrar espaço entre os imensos defesas adversários, para rematar cruzado, levando a bola a passar rente ao poste direito da baliza de Nikopolidis.
Estava traçada a história daquela que se constituirá como uma das maiores desilusões de sempre do desporto português. Ainda assim, e apesar de todos os motivos que possamos ter para chorar esta derrota que ninguém queria estar a viver, temos motivos para nos sentirmos orgulhosos do «nosso» Europeu.
Ganhámo-lo em muitos aspectos. Desde a organização ao «fair-play», passando pelo inesquecível convívio e alegria que nos foi proporcionado ao longo das últimas semanas pelos muitos adeptos de todo o mundo que recebemos de braços abertos. Não foi possível aliar a essa vitória igual triunfo no plano desportivo. Mas de qualquer das formas, soaria a imensa injustiça não deixar aqui o nosso obrigado aos 23 heróis que nos fizeram sonhar como nunca.
Acima de tudo, talvez mais importante mesmo que tudo o resto, heróis que nos fizeram, com a modesta arte do pontapé na bola, reaprender esse conceito cada vez mais estranho que é o de gostarmos do nosso país e ganharmos a convicção de que somos capazes de ser tão grandes como os outros.
Quanto ao resto... Parabéns à Grécia, que fez por merecer o também inédito título esta noite.
Ficha de jogo
Com arbitragem do alemão Markus Merk, as equipas alinharam:
Portugal - Ricardo; Miguel (Paulo Ferreira, 42 m), Jorge Andrade, Ricardo Carvalho e Nuno Valente; Costinha (Rui Costa, 59 m), Maniche e Deco; Figo, Cristiano Ronaldo e Pauleta (Nuno Gomes, 72 m).
Grécia - Nikopolidis; Seitaridis, Dellas, Kapsis e Fyssas; Basinas, Katsouranis, Zagorakis e Giannakopoulos (Venetidis, 75 m); Vryzas (Papadopoulos, 80 m) e Charisteas.
Disciplina: cartão amarelo a Costinha (10 m), Bassinas (45 m), Seitaridis (62 m), Fyssas (66 m), Papadopoulos (84 m) e Nuno Valente (90+2 m).
Marcador: 0-1 por Charisteas (56 m).